Manchete de jornal

Era noite e só dava pra ouvir o suspiro dos ventos. Eu não estava lá muito bem. Cansado e faminto eu rezava pra chegar logo. Especialmente essa noite demorava mais a chegar em casa. Sempre que temos pressa de chegar a um lugar, demoramos mais a chegar nele. Já dizia um conhecido meu. O vento suspirava, como se cansado de tanto soprar. Eu pela janela do ônibus via a cidade com suas luzes fracas e cheias de nostalgia. Sentia uma espécie de calafrio que me subia dos pés até o fio de cabelo mais assanhado da minha cabeça calva.
Era tarde da noite quando finalmente cheguei. O portão estava aberto e a porta apenas encostada. Estranhei um pouco, mas prossegui. Ao entrar dei de cara com Mario Tártaro. Um bandido de aluguel, que estava a serviço de Don Júlio Czar. Eu pertencia à família de Don Júlio, logo meu susto ao ver aquilo.
- Já sabemos do que você sofre.
- É câncer, Mário! Quantas vezes tenho de dizer isso?
- Não te estranha a puberdade com ares de crise de meia idade?
- Mas hein?
- O teu problema é mental, criança. O Dr. Heleno não teve dúvidas quando lhe falei da calvície. Tu não passas de um precoce, um moleque senil.
Corri atrás de um chá de boldo. As vísceras todas latejavam, eu tinha a garganta seca e dor nas costas... Ó céus, a dor nas costas! Para onde fora a lordose, o meu maldito andar torto? Não, não pode ser. Eu voltei a sentir os calcanhares macios. Depois de tantos anos... Tantos anos. Era como levitar.
Naquele momento amaldiçoei a vida. Queria talvez morrer. É eu queria morrer. Só tinha uma coisa a fazer. Tomei o chá de boldo rapidamente. Voltei à sala e encarei o Mário. Ele me olhou estranho parecia ter entendido o que eu pretendia. Ele começou a recuar, mas eu sabia exatamente o que fazer. Então corri pra cima dele. Ele fez o que eu sabia que faria.
“Assassinado jovem com problemas mentais, dizem que ele trabalhava para um gangster dono de boa parte da cidade, Don Júlio Czar”. Foi a manchete dos jornais na manhã seguinte.

Thyago C Correia
Pélvis